Boletim_3111

Entrevista

Ou seja, as teleaudiências têm funcionado bem em audiências de conciliação e iniciais, mas, na prática, sa- bemos que muito raramente um processo é resolvido no primeiro ato, como era a ideia inicial do legislador. Muitos dos processos são resolvidos por meio de acordo e, em outros tantos, a instrução propriamente dita não é realizada na primeira audiência, seja em ra- zão de pedidos que demandam prova pericial, seja em razão da ausência de uma testemunha, seja em razão das não raras pautas longas das varas. Em relação às sustentações orais e distribuição de memoriais junto aos Tribunais Superiores, a experiên- cia é positiva. Apesar do estresse pelo fato de se ter dificuldade para entrar na sala virtual, por falta de inter- net, queda de energia etc., essa experiência veio para ficar. Compensa o desgaste das viagens, traslados em cidades grandes, pernoites. Mesmo em relação aos despachos junto aos desembargadores e ministros, o ambiente é tranquilo e cordial. Percebe-se o enorme esforço por parte dos magistrados e dos servidores, além de extrema dedicação e zelo para que a pande- mia não afete os jurisdicionados. A pandemia agilizou a tendência de modernização das práticas processuais. A audiência telepresencial, cujo cabimento era bastante restrito e ainda não era muito aplicada (casos de oitiva de pessoas em prisão e residentes fora do país, por exemplo), pode vir a ser ampliada, como regra, para outras hipóteses legais, com o objetivo de perseguir a eficiência e efetividade da justiça, assim como a economia processual. Isso inclusive junto aos Tribunais Superiores. COMO MANTER A IDONEIDADE DO PROCESSO E A NÃO COMUNICAÇÃO PARALELA? A MODALIDADE VIRTUAL PODE PREJUDICAR UMA DAS PARTES OU MESMO AS DUAS? Nelson Mannrich: Para a idoneidade do processo e a não comunicação paralela, seria importante a existên- cia de uma sala especial nas sedes dos fóruns para a oitiva da parte ou testemunha, com preparo especial para prestar depoimento por videoconferência. É im- possível atestar a validade do depoimento prestado em local de livre escolha da parte. Não se pode garan- tir que o depoente não está lendo um texto pronto ou sendo orientado de alguma forma. Ou seja, a modalidade virtual da audiência, nas hipó- teses de instrução processual, pode prejudicar ambas as partes. Se utilizada, há grande possibilidade de a

prova estar sujeita à anulação, com o retorno dos au- tos à origem para repetição do ato, postergando des- necessariamente a efetiva solução da causa. OS ADVOGADOS E AS EMPRESAS ESTÃO PREPARADOS PARA ESSE PROCESSO SER A REGRA E NÃO A EXCEÇÃO, UMA VEZ QUE NÃO TEMOS PRAZO PARA O FIM DA PANDEMIA E A VOLTA DE TODOS OS TRABALHOS PRESENCIAIS? Nelson Mannrich: Em razão das diversas questões anteriormente expostas, entendo que os advogados e as empresas não estão preparados para que as audiências de modo geral sejam realizadas de forma virtual. Mas trata-se de um processo que está sendo aperfeiçoado e todos estão se esforçando para sua implantação efetiva. Entendo que o advogado não pode alegar falta de equipamento ou de internet – to- dos hoje se utilizam de computador, de celular e têm à sua disposição internet. De qualquer forma, existe maior abertura para que as audiências de conciliação e iniciais sejam realizadas de forma virtual, o mesmo ocorrendo com sustenta- ção oral e entrega de memoriais ou despacho com o magistrado em casos de mandados de segurança. Por óbvio, nada substitui o contato presencial entre as partes e o juiz, e não há como substituir isso, ape- nas mitigar. COMO EQUILIBRAR O USO NECESSÁRIO DA TECNOLOGIA E AS BASES DO DIREITO TRABALHISTA? Nelson Mannrich: A Justiça do Trabalho atende a grande massa dos trabalhadores e sua ação volta-se a assegurar-lhes proteção e efetividade do processo. Todos sabemda enorme desigualdade social e econô- mica, o que poderia à primeira vista nos convencer de que as audiências por videoconferência não deveriam ser a regra. No entanto, o trabalhador ou é assistido pelo sindicato ou pelo advogado, o que supre aquelas dificuldades. Portanto, nunca se percebeu como agora a importância do advogado e a necessidade de o tra- balhador ser assistido por um. Em um primeiro momento, as teleaudiências certa- mente serão restritas às audiências de conciliação e iniciais. Mas entendo que, a médio prazo, não se de- veria descartar seu avanço, para incluir audiências de instrução. Hoje, ainda não temos tecnologia eficiente

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BOLETIM Nº 3111 | AASP

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